terça-feira, 10 de maio de 2011

Poema aos meus calouros

Ah calouros, que saudade de uma época que nunca foi!

Bem-vindos à desgraça
À adolescência forever
Ao Big Brother Brasil
Às novelas da Globo
À panelinhas
À festas exclusivas
À dogmas mesquinhos
À aulas intoleráveis
À usar o orkut como substituto à uma vida social
À professores que estão convencidos que são deus
E alunos que temem viver

Bem-vindos!
O mundo é bonito
E perfeito
Sociais da grana
Ninguém bebe
Muito menos usa drogas

Não há luta de classes
Nem proletariado
Nem burguesia

Há Big Brother Brasil!
Há trocar idéia com meia dúzia
E ser descolado

Há falar da roupa da tua professora
E de teu colega que falta à aula
Há lindas fofocas
De quem fez o quê

Ah, como queria recitar Poema em Linha Reta
E tomar uma dose de um real no bar do Seu Pedrinho
E falar das constradições entre Álvaro de Campos
E o grande mestre Caieiro

O importante é o orkut!
A vida é secundária

Depois do trote
Os loucos ficarão com os loucos
E os caretas com os caretas

Que belas panelinhas!
Que bela integração!

Pagarei meu dízimo
Levarei uma Ypioca
Tomarei tuas bebidas
Fecharei o Bora Bora
Aguardarei o ERECS!

Fingirei ser simpático
Ser politicamente correto

Usarei jargões mastigados
Falarei de Anarquismo
E da noite passada

Cantarei velhas músicas do Adoniran Barbosa
E de Led Zeppelin (que é um som do caralho!)

Assistirei aulas com meus calouros
(que não reprovaram dois anos seguidos)
Direi que Sociais só vale o diploma
Ficarei triste depois de comer no R.U.
Tomarei um café
Fumarei meu cigarro paraguaio
Reclamarei de como falta Rock n Roll em Maringá

Irei ao Sarau e fingirei que é cultura
Obedecerei à autoridade em nome de passar de ano

Negarei ser sujeito da minha existência
E contemplar a dualidade partícula-onda
E vomitar teorias idosas
E encher meu Currículo Lattes
Como se enche o lixo do banheiro com papel higiênico com merda

Ah, Big Brother Brasil!
Prefiro dormir
À fingir que estou acordado

Ciências Sociais
Que curso da moda!
Vamos entender o que é cultura
E ser alternativos

Vamos gastar 80 reais por mês com textos
E fingir que entendemos

Vamos escutar Belchior e trajar velhos símbolos soviéticos
E babar na Lady Gaga

Eiiiittttaaa, Big Brother Brasil!!!!!!
É isso que dá grana
Sociais da desemprego!

Vou fingir ser pegador
Vou fingir ser educado
Vou fingir saber do que falo

Não sei porque algumas coisas me irritam

Que saudade de uma época que nunca foi!
De um futuro que não será
De um presente que nã é!

Ah C67
Finado Revolução
A Salinas do Seu Adão
O velho sobradinho verde

Onde foram parar?

Como que viramos tão legais?
E tão descolados?

Quando que a vida do orkut
Virou mais real
Do que a vida real?

E o que é real?
É tudo socialmente construído?!?

Esperaremos sempre que os outros façam
Para que não tenhamos que fazer

Amemos Malhação
E coloquemos aquela baita foto linda no orkut
E ainda no fim
Todos cult e cool
Ouviremos Los Hermanos
(ou Chico Buarque)
Com uma reclamação sobre a indústria cultural
E um salgadinho de 3 conto na mão

E eu,
Bebasso
Gritarei "Satanás" em vosso trote
E muitos ficarão ofendidos
Por desafiar a sagrada moral judaico-cristã

Falarei de Pannekoek
E de Herman Goerter
E fingirei saber de Marx mais do que você

Falarei que eu detesto Antropologia
E que não aguento mais ler texto de aldeia

Farei uma defesa da Ciência Política
Te convidarei pro bar
Argumentarei contra a religião
E contra a moral
E contra a centralização

Te falarei de Ferreira Gullar
E da superação do concretismo
E de como o grande Aristóteles estava errado

Te falarei mais uma vez de Ypioca
(como se fosse o velho jargão)
E com certeza direi coisas idiotas
Com um puta bafo de cachaça

Te direi que o Kanarinhus é uma merda (e é)
Que o Democrático é palha
Que o Marcão é cuzão
E que o único bar decente é o Bora
(e é claro o Seu Pedrinho)

Te direi do quanto que detesto sertanejo
E amo o velho Blues

Fingirei no dia 21
Que você, calouro, é burro
E eu, veterano, sou esperto

Contarei até 5.000 no comunidade da minha sala
E falarei de sexo para ser legal

Encontrarei alguma forma de chamar atenção
E serei descolado
Muito descolado

Afinal das contas,
Sociais é um curso cool

Vou pretender que a vida é pura diversão
E esconder minhas palas
Para você não saber

Deus me livre, não vai na esquina do Manhattan na quinta-feira!
Nem me pergunte o que rolou anos atrás
Ou porque que eu sou queimado

Vamos ver MTV
Globo Reporter
Tudo Fantástico!!!

Eu sou um bolinho de arroz!
Minhas perninhas vieram só depois!
Eu não tenho boquinha pra sorrir?

Por que?

Vamos dançar funk no Nite
E fingir que não há moralismo
E muito menos vulgaridade

Vamos no Tribos ser do Rock!
E ser arrogante, como eu, nesta comunidade

Vamos escrever um monte de merda
Regurgitar discursos falsos
E no final de tudo
Sem saber o que dizer
Diremos que Ypioca é uma puta cachaça
(por valer 9 reais)

Vou fingir que meu gosto de bebida é melhor que o teu
E que minha roda é louca
E a tua careta

Vou dizer
(com todo preconceito)
Que Sociais não é agronomia
E que aqui não rola Produfest

Vou me gabar que minha universidade é estadual
E que é a melhor do Paraná

Vou pagar pau para a Marly
E a família Barros

Como adoro uma dose de conservadorismo na minha vida!
Lei seca, Lei seca, Lei seca

Que saudade das épocas do vestiba!
De ver a Mário Urbinatti lotada
Do tomar uma cachaça de Salinas na Padoka

E por que escrevi tudo isto?
Olha, eu não sei
Nem você vai saber

Mas ironia
Sarcasmo
E deboche...

É uma puta idiotice arrogante.

O que tenho à dizer
É que o trote será legal
Seremos todos descolados
E eu tomarei Ypioca

Alguns tomarão cerveja
Outros Jurupinga
Alguns te dirão que Catuaba é a bebida do curso (quando ninguém toma essa merda)

Alguns tomarão água
Alguns tomarão bebidas importadas
Alguns tomarão yakult
Alguns nem tomarão

Mas eu...
vou tomar Ypioca!

- Bartolomeu Parreira Nascimento - Maringá 2011

Nota: Escrevi este poema como protesto antes do início das aulas após ler os comentários infantis postados na comunidade de Ciências Sociais no orkut.

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